DIREITO DE RESISTÊNCIA DO CARTEIRO - Parte 1

O DIREITO DE RESISTÊNCIA DO CARTEIRO FRENTE ÀS ATIVIDADES POSTAIS DE RISCO


DIREITO DE RESISTÊNCIA DO CARTEIRO

INTRODUÇÃO


Este artigo tem por objetivo geral fazer com que os Sindicatos dos Trabalhadores dos Correios orientem os trabalhadores e pressionem a ECT no sentido de estabelecer melhores condições de trabalho em relação aos carteiros que têm sido vitimados com a violência física e psicológica dos criminosos quando da entrega dos objetos postais nas áreas de risco.

O principal problema é que os trabalhadores na sua maioria não sabem dos seus direitos e tampouco dos procedimentos internos que deveriam ser adotados pela empresa nas regiões perigosas, ou seja, em situações cujo risco seja acentuado. Vários carteiros já sofreram diversos tipos de violência, desde agressões físicas a ameaças de morte, o que tem elevado o número de afastamentos médicos.

DIREITO DE RESISTÊNCIA DO CARTEIRO
Carteiro foi baleado no abdômen
Será apresentado o direito de resistência obreiro, que pode ser utilizado nas situações em que exista o abuso ou a ilicitude por parte do empregador. Será demonstrado que a ECT possui mecanismos (pouco utilizados) voltados para a proteção do empregado e manutenção das atividades postais sem prejuízo aos clientes.

Busca-se com este trabalho, portanto, a obtenção de melhores condições de trabalho, que não devem se resumir nas chamadas cláusulas econômicas, mas também nas cláusulas sociais, que passa pela procura de um sadio ambiente de trabalho.

1 -  PRINCÍPIO DO DIREITO DE RESISTÊNCIA OBREIRO


Dentre os princípios específicos do Direito do Trabalho, deve ser destacado o Princípio do Direito de Resistência Obreiro, também conhecido como jus resistentiae, que é a prerrogativa de o empregado opor-se, validamente, a determinações ilícitas oriundas do empregador no contexto da prestação laborativa.

Em outras palavras, o Direito de Resistência deve ser exercido pelo trabalhador toda vez que a empresa se exceder, utilizando-se de práticas ilegais ou abusivas. Tal direito do trabalhador decorre diretamente do uso irregular do poder diretivo patronal.

Um dos efeitos do contrato de trabalho é o poder empregatício, que se manifesta em várias dimensões: diretiva, regulamentar, fiscalizatória e disciplinar. Regra geral, esse poder favorece a figura do empregador, uma vez que concentra um conjunto de prerrogativas de grande relevo socioeconômico, conferindo-lhe enorme influência no âmbito do contrato e da própria sociedade.

Nesse sentido, até como uma antítese a esse vasto poder da empresa, resta ao trabalhador contrabalancear legitimamente com o seu direito de resistência, sempre que houver ilicitude por parte do patrão:

É válida e juridicamente protegida a resistência obreira a ordens ilícitas perpetradas pelo empregador no contexto empregatício. O chamado direito de resistência (jus resistentiae) é, portanto, parte integrante do poder empregatício. Na verdade, sua configuração é apenas mais uma cabal evidência do caráter dialético (e não exclusivamente unilateral) do fenômeno do poder no âmbito da relação de emprego.

A utilização do Direito de Resistência pelo trabalhador deve corresponder ao exercício regular de um direito, o que, portanto, não pode gerar falta trabalhista a ele. Um dos fundamentos legais encontra-se nos artigos 187 e 188, I, do Código Civil, os quais são utilizados na esfera trabalhista por força do art. 8°, parágrafo único, da CLT.

DIREITO DE RESISTÊNCIA DO CARTEIRO
O empregador possui o chamado jus variandi, que é o poder de fazer, justificadamente, alterações no contrato de trabalho, já que assume os riscos da atividade econômica. Tais alterações são necessárias para que o contrato de trabalho atenda às necessidades da atividade empresarial. Contudo, o jus variandi não deve ser exercido sem qualquer restrição, encontrando dois obstáculos em seu caminho, quais sejam: a lei e a vedação de prejuízo ao empregado.

Nesse passo, surge, exatamente desses dois limites, o jus resistentiae, que é a prerrogativa do empregado de resistir ao ato ilícito ou arbitrário do empregador. Entretanto, esse direito de resistência do trabalhador não pode caracterizar outra violação, já que consistiria em abuso de direito, o que equipara-se ao ato ilícito.

Assim, o empregado deve exercer sua resistência dentro dos limites da legalidade. O exercício do jus variandi pelo empregador é plenamente admissível, mas há de ser contrabalançado pelo jus resistantiae reconhecido ao obreiro.

Abaixo, alguns exemplos em que o empregador se excede, hipóteses estas em que trabalhador poderá exercer seu direito de resistência:


  • Ordens dadas contrárias ao direito;
  • Ordens dadas por pessoas não legitimadas;
  • Ordens para executar atividades alheias à prestação do serviço;
  • Ordens para executar atividades que exponham a saúde a risco;
  • Ordem para fazer horas extras além do limite legal permitido;
  • Desrespeito às restrições médicas;
  • Transferências abusivas (sem real necessidade de serviço);
  • Aumento da jornada de trabalho.

Existem categorias em que o risco é inerente à profissão, estando previsto no contrato de trabalho, por exemplo os vigilantes armados.

Excepcionando-se tais casos, o empregado pode, de maneira legítima, recusar-se ao cumprimento de uma ordem que o coloque em grave risco, que fuja à natureza do trabalho contratado, que o humilhe ou diminua moralmente, que seja ilícita, ilegal ou de execução extraordinariamente difícil.

A resistência do trabalhador ao ato patronal abusivo não pode ser com outro ato também abusivo. Deve o empregado ser moderado, utilizando-se do meio menos danoso, mas que seja eficaz:

É o empregado quem identifica a violação de seu próprio direito e elege a solução ótima, dentre as várias opções possíveis. Na escolha dessa solução, como vimos, deve avaliar a sua idoneidade para alcançar o fim pretendido e, basicamente, agir com moderação, relacionando o dano sofrido com o dano a ser causado.

DIREITO DE RESISTÊNCIA DO CARTEIRO
Se porventura o trabalhador, ao resistir, não for proporcional em relação à ordem ilegal, não se valendo de meios moderados, será caracterizado uma resistência ilícita, o que, dependendo da gravidade do caso, poderá culminar numa punição, desde advertência por escrito, suspensão ou até mesmo uma despedida por justa causa, por insubordinação, indisciplina, desídia, dentre outras faltas trabalhistas.

Exemplo clássico ocorre quando o empregado, diante de um abuso do empregador, reage com palavrões ou mediante excessos verbais incompatíveis com o dever de urbanidade que deve prevalecer no ambiente de trabalho. O direito de resistência possui limitações racionais na licitude do ato, sendo certo que sua proporcionalidade não admite equiparação, em gravidade e intensidade, ao erro cometido pelo agressor, sob pena de se incorrer no exercício arbitrário das próprias razões.

Portanto, apesar de aparentemente ser contrário à subordinação jurídica, que é elementar ao empregado, o direito de resistência não deve ser confundido com a insubordinação. Ele só deverá incidir quando o empregador extrapolar os limites do seu poder de comando.

Fim da Parte 1

Leia a Parte 2

Leia a Parte 3 e Final

Fabrício Máximo Ramalho
Dirigente Sindical
Advogado
Pós-Graduando em Direito e Processo do Trabalho

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